sexta-feira, 27 de maio de 2011

Não preciso de muito.

Há dias entrei numa das mais antigas pastelarias de Lisboa para comprar tabaco. Faço sempre uma certa cerimónia quando entro numa pastelaria para comprar tabaco. É como pedir  um copo de água. Nunca me foi recusado (o tabaco, entenda-se, não tenho assim tanta lata), mas fico sempre com aquela sensação de que estou a abusar da boa vontade dos empregados. Não damos a ganhar nada à casa e ainda roubamos o precioso tempo do staff, que poderia estar a satisfazer os desejos requintados dos clientes gastadores e lucrativos.

Desde que inventaram aquelas máquinas de tabaco com comandos à distância ridículos a coisa ficou ainda mais absurda. É como se tivesse de pedir autorização ao "senhor do café" para fumar. E alguns ainda me dão aquele olhar do "tem a certeza?" Arre gaita, pois claro que tenho, aperte lá o botãozinho do comando, fachavor, para poder introduzir as moedinhas e exercer plenamente o meu livre arbítrio constitucionalmente protegido. Sem moralismos, já agora, que isso de ser moralista já está démodé.

Por este andar, qualquer dia é preciso uma declaração de idoneidade para comprar uma carteira de fósforos.

A máquina estava distante do balcão e eu desesperadamente procurava o contacto visual de um dos empregados, atarefados na sua lufa-lufa, sem me aproximar muito da montra farta de bolos, salgados, miniaturas e sandes de panado. Não querendo induzir ninguém em erro nas minhas reais intenções, mantive-me a meio caminho entre o tentador balcão e a dita máquina na esperança que fosse suficiente para ser entendida.

Levanto o braço envergonhadamente.

"Olhe, desculpe..."

Nada.

"Sai uma bica!"

Olho para o outro empregado como se precisasse verdadeiramente de um copo de água. Ninguém me iria deixar morrer à sede.

"Olhe, se faz favor..."

Contacto visual. Estava safa.

"Podia..."

E aponto com o polegar para a máquina que estava atrás de mim, assumindo que estava a ser inteiramente compreendida. Descansei quando vi o "senhor do café" a retirar o comando do prego onde se encontrava pendurado.

Fez-me um olhar poderoso.

"Podia mostrar-me o seu bilhete de identidade?"

Embasbaquei-me. Estava de fato e de facto embasbacada.

"Vá, desta vez passa..."



 
Não preciso de muito para sorrir.




2 comentários:

Lima disse...

Grande flirt!

moi disse...

como diria o sábio do meu sobrinho, do alto da sua experiência de cinco anos de vida, 'é a vida!'.