terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O meu cavalo branco

Nunca tive aulas de equitação e não houve príncipe encantado que tivesse galopado pelo meu bairro fora, mas se há coisa que me orgulho de ter é um cavalo branco. É de metal e não passa do metro e meio de altura, mas para mim é um garanhão.

Quando era miúda fiz uma birra - das poucas que me lembro - porque queria ter um cavalo. Num quarto andar. Na varanda. Andar com o cavalinho escada acima, escada abaixo, parecia-me completamente razoável. O espaço da varanda era perfeito para uma box. E confesso que até hoje ainda não houve ninguém que demovesse a minha lógica pueril - nem eu própria.

Fica o sonho de um dia aprender a andar a cavalo. Até lá, ando de Renault Clio, que já vai para os seus vinte aninhos. Qualquer coisa como este:




Muitos quilómetros já eu fiz naquele carro, uns mais sofridos que outros. Alguns bastante animados. Outros a refilar com o da frente, com o do lado, com o de trás. Acompanhou-me durante quase toda a licenciatura, o início da minha vida profissional, muitas idas à Costa, ao Meco, a Cascais e outros destinos que não sei descrever. Aturou a minha desorientação geográfica e as horas perdidas no trânsito de Lisboa. Ouviu-me a chorar, a rir e a falar ao telemóvel. Já levou panadas (da esquerda, pois então), multas (de estacionamento) e já ficou sem antena (que estava colada, impedindo qualquer reparação).

Nunca tive de lhe mudar um pneu e nunca me deixou parada na estrada. Esteve para morrer várias vezes, mas aguentou-se sempre até ao seu destino. Até me levar a bom porto.

Há uns anos roubaram-lhe o rádio - o único elemento com valor comercial que continha no seu interior. Julguei que mais nada havia a temer.

Enganei-me. O Universo (chamemos-lhe assim) trocou-me as voltas.

É sempre naqueles dias que estamos atrasados, mais stressados e mais indispostos que os pincéis acontecem.

Sento-me no meu cavalo branco, rodo a chave e 

Nada.

Nem um "clique", nem uma tosse, nem um suspiro, nada.

Um acesso de raiva irrompe-me pescoço fora. Controlo-me. Tento outra vez. Nada.

O relógio parado.

- Havias de ter ficado sem bateria logo hoje, rai's t'a partam.

Terei deixado as luzes ligadas? Não, tudo fechado. Estranho. Não me lembro de ter deixado este guarda-chuva em cima do banco.

Não tinha tempo a perder, fechei a porta e segui caminho.

Liguei para o meu private SOS - a quem carinhosamente chamo de Pai - e explico-lhe a situação

- O Clio ficou sem bateria. Não, não deixei as luzes ligadas. Sim, tenho a certeza que não deixei as luzes ligadas. Está bem, fica então para a semana que vem.

E na semana seguinte, que era altura de mandar fazer a inspecção obrigatória, o meu Pai chama o reboque para tratarem da bateria e do resto que fosse necessário.

Eis senão quando, o mecânico abre o capô e pergunta ao meu Pai

- Onde é que está a bateria?

Ao que o meu Pai, imediatamente, lhe responde

- Não sei, vou ligar à minha filha.

Atendi o meu Pai e, num primeiro momento, nem percebi bem a pergunta

- Eu? Mexi na bateria? Não! A que propósito? Nem abri o capô!

A conclusão era demasiado ridícula para ser real, mas não havia outra explicação. Tinham roubado a bateria ao meu cavalo branco.

 Alguém, com muito pouco para fazer, deu-se ao trabalho de entrar no meu bólide com mais de vinte anos de idade, puxar a patilha do capô e levar a bateria. Não levou mais nada, nem o guarda-chuva. Só mesmo a bateria. Também ficou uma bela trampa, que volta e meia já me andava a falhar. Pois que faça bom proveito.

Eu percebo tanto de mecânica como de japonês em braille, mas algo me diz que aquilo foi um péssimo negócio.

Só espero é que não venham fazer segundas tentas. É que agora já tem uma bateria nova. Está é sem gasolina.





2 comentários:

camaleoa disse...

Moça, só tu.. Hahahaahahaha...

Bjs**

rg disse...

Gostei do japonês em braile. Teve razoável piada.
;-)